Carteira Assinada
Carteira assinada expressa o testemunho da trajetória de trabalho e luta de Francisco Xavier, escrito em 1982. Devido às condições em que vivíamos naquele ano, ainda sob a ditadura militar, achamos prudente não dar a conhecer sua autoria e tampouco identificar as fábricas onde trabalhara.
Passados 41 anos, vale perguntar sobre os motivos de publicá-la aqui em Encontraponto. Eis a nossa principal motivação: por ser um meio de promover a autoeducação. Como ele sugere no arremate de sua narrativa autobiográfica, a classe operária somente existe como classe na medida em que luta. Uma luta sem tréguas ou a morte, como escreveu George Sand, palavras apropriadas por Karl Marx no epílogo de A miséria da filosofia, escrita em 1847.
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"Venho de uma família de pequeno-burguesia, uma família com oito irmãos que, trabalhando, conseguiu manter uma pequena oficina. Mas como a família era grande, os mais velhos cedo receberam a incumbência de trabalhar.
Corria o ano de 1960. Eu estava terminando a 4ª série do primário quando meu pai me disse que já tinha arrumado um trabalho para mim. Neste tempo eu estava com 13 anos. Passei dois anos nesse emprego, uma grande casa comercial tipo Sendas. Ali pouco aprendi, a não ser trabalhar para enriquecer mais o bolso dos capitalistas. Era uma exploração tremenda, não registravam ninguém, o horário era de 15 a 16 horas por dia, enfrentando todo e qualquer tipo de trabalho.
Em 1962, quando houve aquele "quebra-quebra" nas casas comerciais, o gerente chamou os funcionários e disse que tinha um monte de baderneiros e agitadores quebrando tudo e nós tínhamos que defender o nosso patrimônio, reparem bem o que ele disse "nosso patrimônio" - e infelizmente a gente achava que ele estava certo.
(...)
Veio 1964, fizemos greve, já tínhamos feito outras, mas infelizmente os operários, naquele tempo, apenas sentíamos ódio, não tínhamos uma direção que nos guiasse e fomos todos a pique. Foi grande o corte e as prisões feitas na fábrica. Ninguém até hoje sabe o que foi feito daquele grupo. Os operários começaram a ser "empacotados". Esta foi a fábrica A."
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Imagem de capa: foto da linha de produção na Stantard Eletric, em Cascais (Portugal), por volta de 1950/60. Fonte: Restos de Colecção.